Otimização de Cutoff no KPI-COSMO: Aprimorando as Decisões de Destino sob Incerteza
Introdução: Por que planejamos minas estrategicamente e qual é o papel da otimização do cutoff e da incerteza geológica nesse processo
O objetivo do planejamento de mina de longo prazo é definir uma estratégia que maximize o valor do ativo mineral, tradicionalmente representado pelo Valor Presente Líquido (VPL), por meio da otimização da sequência de lavra, das políticas de cutoff e das decisões ao longo da cadeia de valor. Isso significa que o planejamento de longo prazo não busca determinar exatamente para onde cada bloco será enviado, já que essas decisões serão tomadas com base nos dados de controle de teores disponíveis durante a operação. Em vez disso, o foco está em prever as quantidades esperadas — as projeções resultantes — de teores, massas de minério e estéril, fluxos de caixa e outros parâmetros relevantes¹–³.
Mas essas projeções são tão boas quanto o modelo geológico que as sustenta (e a geologia é incerta). Utilizar um único modelo de blocos suavizado estimado⁴,⁵ combinado com valores fixos de cutoff esconde essa variabilidade⁶, levando a planos de produção excessivamente otimistas ou conservadores — ou seja, arriscados, com alta probabilidade de não se concretizarem⁷.
O KPI-COSMO propõe uma abordagem diferente: um modelo de otimização estocástica que incorpora diretamente a incerteza no processo decisório. Em vez de confiar em um modelo estimado único e valores fixos de cutoff, ele busca a política ótima de cutoff entre diversas versões simuladas do depósito, com o objetivo de maximizar o VPL ao mesmo tempo que controla os riscos⁸,⁹.
Ao modelar a probabilidade de cada bloco ser minério ou estéril, o otimizador gera não apenas um plano, mas uma projeção probabilística. Isso reflete a incerteza geológica do depósito e apoia decisões estratégicas com mais confiança. O resultado: melhores previsões de produção futura, menos surpresas na execução e maior alinhamento entre planos e realidade.
Neste artigo, exploramos como funciona a otimização de cutoff sob incerteza no KPI-COSMO — e por que aceitar o risco geológico, em vez de ignorá-lo, leva a melhores resultados no planejamento de mina.
Cutoff Grade: O motor por trás das projeções e do valor da mina
Na mineração, o cutoff é o teor mínimo que define se um bloco será tratado como minério ou estéril. Na prática, essa decisão raramente é constante ao longo da vida útil da mina — e ela exerce um papel central no planejamento estratégico. A escolha do cutoff deve ser otimizada, pois afeta diretamente as previsões de massas de minério e estéril, a qualidade do material alimentado na planta e o Valor Presente Líquido (VPL) do projeto¹⁰–¹².
Com o avanço do planejamento de mina, o conceito de cutoff evoluiu de um valor fixo para um valor dinâmico e otimizado, adaptando-se a preços de mercado, custos e restrições operacionais. Com a introdução da modelagem estocástica, essa evolução foi ainda além: os teores de corte deixam de ser parâmetros fixos e passam a ser variáveis de decisão em um processo integrado de otimização que considera a incerteza geológica.
No fim das contas, por que otimizamos o cutoff? Porque ele define quanto minério será produzido, quanto estéril será movimentado e, em última análise, quanto valor será gerado. Uma boa política de cutoff maximiza o VPL não eliminando a incerteza, mas tomando decisões mais inteligentes diante dela.
Mas como fazemos isso com 50 simulações, sem definir um cutoff fixo previamente e sem programar a lavra com base em fases e cavas pré-definidas e não otimizadas economicamente? Essa é a mágica da otimização estocástica de complexos minerais.
Otimização Estocástica: Uma forma mais inteligente de planejar sob incerteza
Diferente dos métodos determinísticos, que otimizam apenas um único cenário, a otimização estocástica no KPI-COSMO busca maximizar o Valor Presente Líquido (VPL) minimizando, ao mesmo tempo, o risco de desvio em relação às metas de produção, considerando múltiplas realidades simuladas e diferentes fontes de incerteza.
- Sequência dos blocos – Quando cada bloco será lavrado.
- Destino dos blocos – Para onde cada bloco será enviado.
- Fluxo de processamento – Qual rota entre os destinos será seguida.

Neste modelo, as políticas de cutoff não são regras predefinidas — elas surgem como variáveis de decisão otimizadas. O KPI-COSMO ajusta dinamicamente esses limites durante o sequenciamento, identificando estratégias que maximizam o valor enquanto respeitam os requisitos de blending, as restrições operacionais e as capacidades das usinas ao longo da cadeia de valor (por exemplo, o complexo mineral).
Ao final do processo de otimização, é selecionada uma política de cutoff ótima, ano a ano, para cada tipo de material em cada mina, com o objetivo de maximizar o valor e gerenciar o risco dentro do contexto específico.



Como o KPI-COSMO escolhe a política de cutoff ideal

O otimizador realiza milhares de iterações para encontrar a solução que — junto com as outras duas variáveis de decisão (sequência e fluxos de processamento) — maximize o VPL, minimize os desvios em relação às metas de produção e crie uma sequência operacional.
- A política de cutoff nº 1 não é selecionada porque não garante o VPL máximo (poucos blocos são enviados à usina).
- A política de cutoff nº 3 não é selecionada porque, embora proporcione um VPL maior, gera produtos com baixo teor e excede a capacidade da planta.
- A política de cutoff nº 2 é a que maximiza o VPL, gerando um produto com a qualidade desejada e respeitando a capacidade da planta.

- bloco em roxo, no canto superior esquerdo, tem 0% de chance de ir para a usina – todas as simulações o direcionam para a pilha de rejeito. Trata-se de um bloco de baixo risco.
- bloco em vermelho, no canto inferior direito, tem 100% de chance de ir para a usina – todas as simulações o classificam como minério. Também é um bloco de baixo risco.
- bloco em verde, no centro, tem 66% de chance de ir para a usina sob a política de cutoff otimizada (0,3%) – em 2 das 3 simulações ele vai para a usina, e em 1 para a pilha de rejeito. Trata-se de um bloco de alto risco.
- bloco em azul claro, no canto inferior esquerdo, tem 33% de chance de ir para a usina sob a política de cutoff otimizada (0,3%) – apenas 1 das 3 simulações o envia para a usina, enquanto 2 o direcionam para a pilha de rejeito. Também é um bloco de alto risco.
Importante: o algoritmo não elimina o risco geológico — ele o gerencia. Ao avaliar a probabilidade de cada bloco ser destinado a uma determinada rota ao longo das simulações, o otimizador identifica blocos com alta incerteza de classificação e tende a postergá-los na sequência de lavra. Isso não apenas reduz o risco de alocação incorreta precoce, como também aproveita o efeito do desconto: adiar decisões de alto risco geralmente resulta em melhores resultados de VPL.
- Identifiquem blocos de alto risco próximos aos limites de cutoff, especialmente em zonas de transição.
- Priorizar áreas de alta confiança, reduzindo a dependência de estoques intermediários e retrabalhos.
- Melhorar a aderência ao plano, alinhando as decisões de destino à variabilidade real dos blocos.
- Apoiar decisões estratégicas, como a viabilidade econômica de rotas de processamento e evitar CAPEX desnecessário.
- E, por fim, gerenciar proativamente o risco geológico, transformando a incerteza em uma ferramenta para otimização de valor.
Ao integrar diretamente as probabilidades de destino no processo de otimização, os planejadores podem criar planos de lavra mais resilientes e flexíveis — especialmente em contextos que envolvem múltiplas opções de processamento ou decisões de investimento em plantas.
Exemplo do Mundo Real: Tomadas de Decisão de CAPEX Mais Inteligentes com Políticas de Cutoff Otimizadas
A seguir, apresentamos um exemplo de um complexo mineral real com uma planta existente de produto de alto teor e uma planta de concentração de baixo teor proposta. O foco foi um tipo específico de material que, segundo a abordagem determinística tradicional, havia sido anteriormente classificado como estéril.
- A empresa deve expandir a capacidade da planta de alto teor para processar esse material?
- A planta de concentração de baixo teor é realmente viável para processá-lo?
Tradicionalmente, essas perguntas seriam abordadas com base em um único modelo de blocos estimado e valores fixos de cutoff, o que poderia ocultar fatores de risco críticos. Em vez disso, a equipe utilizou um modelo totalmente estocástico, que incorporou a incerteza: 20 simulações geológicas e de teor foram combinadas com um processo de otimização unificado, no qual os teores de corte não foram definidos previamente, mas descobertos como saídas otimizadas da própria otimização.

A otimização estocástica revelou que:
- Embora a mina apresente alta probabilidade de enviar blocos para essa planta, os perfis de risco das tonelagens alimentadas caem significativamente após os primeiros anos em várias simulações. Diversos cenários resultaram em desligamento precoce da planta, tornando sua expansão economicamente injustificável.
- Por outro lado, como mostrado na imagem, a maioria dos blocos tem alta probabilidade de ser enviada à planta de concentração de produto de baixo teor, resultando em maior valor global do projeto.
- O otimizador considerou a sinergia entre as plantas e também as simulações do metal principal e dos contaminantes durante a otimização, demonstrando que a expansão da planta de alto teor não é necessária devido aos riscos de qualidade e à disponibilidade decrescente.
- O modelo probabilístico demonstrou que expandir essa planta resultaria em baixos retornos sob incerteza.
Em contraste, a planta de produto de baixo teor mostrou-se resiliente e economicamente atrativa:
- Como pode ser visto nas imagens, há muitos blocos da mina com alta probabilidade de serem consistentemente direcionados a essa planta em todas as simulações.
- As previsões probabilísticas (P10, P50 e P90) indicaram uma taxa de alimentação estável e sustentada ao longo de toda a vida útil da mina.
- As restrições rigorosas de contaminantes foram respeitadas.
- Os teores do produto final atenderam ou superaram consistentemente as especificações comerciais.
Os benefícios se estenderam também às operações de mina:
- Redução significativa na movimentação de estéril e na razão de estéril, com uma queda superior a 20% em comparação ao plano determinístico.
- Um VPL semelhante ao benchmark determinístico, porém sem necessidade de CAPEX adicional e com custos operacionais significativamente menores.
- Todas as restrições operacionais — como taxa de avanço (sinking rate) e largura mínima de lavra — foram respeitadas, confirmando a viabilidade prática do plano.
Por que isso é importante
Ao otimizar os teores de corte em vez de utilizar uma regra fixa, o modelo permitiu decisões mais inteligentes na hora de equilibrar lucro, risco e capital, escolhendo as melhores opções para as plantas. Em vez de comprometer milhões em CAPEX para buscar retornos incertos com a expansão de uma planta de alto teor com qualidade e produção instáveis, a empresa ganhou confiança para:
- Priorizar rotas de produção de produto de baixo teor, mais estáveis e com desempenho consistente.
- Evitar investimentos desnecessários em projetos de expansão de alto risco.
- Utilizar cronogramas informados por risco para apoiar decisões estratégicas sob incerteza.
Este caso real ilustra o valor central dos destinos probabilísticos dos blocos: em vez de perguntar “o que este bloco pode ser?”, o algoritmo pergunta “o que devemos fazer com este bloco e para onde devemos enviá-lo — sob incerteza — para otimizar valor?”.
Conclusão: Uma Mudança em Direção ao Planejamento Resiliente
Referências
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- Rendu, J. M. An Introduction to Cut-Off Grade Estimation. (Society for Mining, Metallurgy and Exploration – SME, 2014).

Douglas Alegre
Douglas é consultor em planejamento de minas, com ampla experiência em planejamento estratégico e operacional, modelagem econômica e avaliação de projetos. Atuou em uma grande variedade de minérios — incluindo ouro, minério de ferro, cobre e terras raras — apoiando as principais empresas de mineração no Brasil. Seu foco está em consultoria, implementação e treinamento para ajudar os clientes a adotarem ferramentas avançadas de planejamento de minas baseadas em simulação. Conecte-se com Douglas no Linkedin.